COP 30 e Contratações Públicas: Sustentabilidade como Pilar Estratégico da Administração

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COP 30 e Contratações Públicas: Sustentabilidade como Pilar Estratégico da Administração 2

Daiesse Jaala

Chefe de Auditoria de Licitações e Contratos na Advocacia-Geral da União.

Auditora de Controle Externo no Tribunal de Contas do Município de São Paulo.

Advogada com pós-graduação e mestrado em Direito Público.

Lucélia Lages

Assessora Técnica na Procuradoria de Licitações e Contratos da Procuradoria Geral do Estado do Piauí

Advogada com pós-graduação em licitações e contratos

As discussões relacionadas ao meio ambiente e à sustentabilidade, especialmente diante de eventos globais como a Conferência das Partes (COP 30), destacam a importância das ações concretas adotadas pelos entes públicos. Nesse cenário, as contratações públicas mostram-se instrumentos de fundamental importância, promovendo e apoiando mudanças estruturais por meio da integração dos princípios fundamentais do direito ambiental ao planejamento e à execução das aquisições públicas.

Prova disso é que, através da Lei n. 14.133/2021, o princípio do desenvolvimento nacional sustentável foi introduzido como um de seus pilares, devendo ser um dos objetivos do procedimento licitatório o incentivo às compras públicas sustentáveis, como previsto no art. 11, IV da Lei de Licitações, atendendo, portanto, dentro dos ODS[1] firmados, a Meta 12.7, atinente à promoção de práticas de Compras Públicas Sustentáveis alinhadas ao Objeto 12 da Agenda 2030, que visa assegurar padrões de produção e de consumo sustentáveis.

No direito ambiental, destacam-se três princípios centrais que norteiam as ações e responsabilidades ambientais: o princípio da prevenção, o princípio da precaução e o princípio do poluidor-pagador. Embora nem sempre explicitados por seus nomes técnicos, esses princípios aparecem de forma clara e efetiva nas diversas etapas das contratações públicas, sobretudo na fase de planejamento.

O princípio da prevenção incide especialmente em situações em que são conhecidos os possíveis impactos ambientais decorrentes da execução de obras ou serviços. Por exemplo, ao exigir no processo licitatório, as licenças ambientais prévias e as autorizações para execução das obras, a Administração Pública exerce papel fiscalizador, antecipando-se e evitando a ocorrência de danos ambientais futuros. Édis Milaré[2], afirma que “os objetivos do direito ambiental são fundamentalmente preventivos, em que sua atenção está voltada para o momento anterior à da consumação do dano – o do mero risco.”

Aplica-se, ainda, o mesmo princípio, à postura prudente e cautelosa, que impõe à Administração Pública o dever de realizar estudos técnicos aprofundados, avaliações de risco e impacto ambiental antes de proceder a determinadas contratações. Continuando com as lições de Édis Milaré, “o estudo do impacto ambiental, previsto no art. 225,§1º, IV, da CF, bem como a preocupação do legislador em “controlar a produção, a comercialização e o emprego de técnicas, métodos, e substâncias que comportem risco para a vida, a qualidade de vida e o meio ambiente” manifestada no mesmo artigo, inciso V, são exemplos típicos deste direcionamento preventivo.”[3] Nesse contexto, os estudos prévios, tais como os Estudos de Impacto Ambiental (EIA) e os Relatórios de Impacto Ambiental (RIMA), refletem a aplicação direta do princípio da prevenção, evitando decisões precipitadas frente ao desconhecimento científico ou técnico dos possíveis danos.

Finalizando essa tríade importantíssima, temos o princípio do poluidor-pagador, “inspirado na teoria econômica de que os custos sociais externos que acompanham o processo produtivo devem ser levados em conta ao elaborar os custos de produção e, consequentemente, assumi-los”[4], determinando que o responsável pela poluição deve assumir os custos ambientais decorrentes da atividade poluidora.

Não se trata, evidentemente, de uma autorização prévia para poluir mediante pagamento, mas sim da imputação de responsabilidades concretas e financeiras pelos danos causados ao meio ambiente. Este princípio se concretiza nas contratações públicas, por exemplo, quando a Administração prevê explicitamente nas planilhas de custo da obra ou serviço contratado o acondicionamento, descarte adequado e tratamento de resíduos gerados pela atividade. Desse modo, tanto o ente público contratante quanto as empresas contratadas, compartilham a responsabilidade de mitigar e reparar eventuais danos ambientais.

Tais princípios são indispensáveis, e estão presentes de maneira imperiosa e imprescindível no planejamento das contratações públicas, principalmente diante do cenário desafiador proposto pela COP 30. Assim, ao inserir explicitamente tais princípios no planejamento prévio das licitações, a Administração Pública tem a oportunidade ímpar de alinhar suas aquisições aos objetivos globais de sustentabilidade, tornando as compras públicas verdadeiros instrumentos de justiça social e climática.

A realização da COP 30, no Brasil, representa uma oportunidade ímpar para que a Administração Pública reforce seu compromisso com a sustentabilidade, utilizando as contratações públicas como instrumento de justiça climática, através da incorporação de práticas alinhadas aos princípios ambientais e sociais no planejamento estratégico das aquisições públicas, não devendo ser encarada como algo opcional, mas como elemento intrínseco ao planejamento.

Nesse contexto, o planejamento das contratações deve considerar: avaliação da necessidade (questionamento da real necessidade), análise do ciclo e vida (avaliação do impacto ambiental), especificações técnicas sustentáveis (priorizar produtos e serviços com menor impacto ambiental, contribuindo com práticas responsáveis no mercado fornecedor) e capacitação dos agentes públicos (investimento em formação contínua dos servidores envolvidos nas contratações públicas).

A realização da COP 30 representa uma oportunidade singular para nosso país, em uma conjuntura de contratações públicas emergindo como instrumentos preponderantes para promover transformações significativas na Administração Pública e na sociedade.

A Lei n. 14.133/2021, ao estabelecer o desenvolvimento nacional sustentável como um dos princípios norteadores das licitações públicas, reforça a necessidade de incorporar critérios ambientais e sociais desde as fases iniciais do planejamento das contratações. A adoção dessas práticas, não atende apenas às exigências legais, mas também contribui para a mitigação dos impactos ambientais e para a promoção da equidade social.

Exemplos concretos de iniciativas bem-sucedidas demonstram o potencial transformador, quando atendemos aos requisitos da sustentabilidade. No estado do Mato Grosso do Sul, políticas como o Pagamento Por Serviços Ambientais (PSA)[5], instituída pela Lei n. 5.235, de 16 de julho de 2018.[6]

No âmbito federal, o Ministério da Gestão e da Inovação em Serviços Públicos tem liderado esforços para promover contratações públicas sustentáveis. A Estratégia Nacional de Contratações Públicas para Desenvolvimento Sustentável (ENCP)[7], visa utilizar o poder de compra do Estado para impulsionar a economia, estimular a produção local, gerar emprego e renda, promover inclusão social e fomentar práticas ambientalmente responsáveis.

Essas iniciativas evidenciam que as contratações públicas sustentáveis são ferramentas eficazes para a promoção da justiça climática e social. Ao incorporar critérios de sustentabilidade nas aquisições governamentais, a Administração Pública não apenas cumpre com suas obrigações legais, mas também contribui ativamente para a construção de um futuro mais justo e com um avanço sustentável.

Diante dos desafios impostos pelas mudanças climáticas e das oportunidades oferecidas pela COP 30, é imperativo que os gestores públicos reconheçam o potencial transformador das contratações sustentáveis e adotem práticas que reflitam esse compromisso com as futuras gerações. A integração de critérios ambientais e sociais nas contratações públicas deve ser encarada não como uma opção, mas como uma responsabilidade ética e estratégica para o desenvolvimento sustentável do país.


[1] TRAJANO, André. Sustentabilidade em Compras Públicas: o uso de critérios de sustentabilidade à luz do triple bottom line no processo de contratualização pública. 1ª ed. Rio de Janeiro: 2023.

[2] MILARÉ, Édis. Direito do Ambiente: doutrina, prática, jurisprudência, glossário. 2ª ed. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2001, p. 118.

[3] MILARÉ, Édis. Direito do Ambiente: doutrina, prática, jurisprudência, glossário. 2ª ed. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2001, p. 119.

[4] Idem.

[5] Governo amplia extensão de programa e vai pagar por serviços ambientais nas bacias dos rios Salobra e Betione. Instituto de Meio Ambiente de Mato Grosso do Sul – IMASUL, 2025. Disponível em: https://www.imasul.ms.gov.br/governo-amplia-extensao-de-programa-e-vai-pagar-por-servicos-ambientais-nas-bacias-dos-rios-salobra-e-betione/#:~:text=O%20pagamento%20por%20servi%C3%A7os%20ambientais,PSA%20do%20governo%20do%20Estado. Acesso em 02 jun. 2025.

[6] Disponível em:

https://aacpdappls.net.ms.gov.br/appls/legislacao/secoge/govato.nsf/448b683bce4ca84704256c0b00651e9d/424c9b5475e2a9c3042582cd004595f8 . Acesso em 02 jun. 2025.

[7] Disponível em: https://www.gov.br/gestao/pt-br/assuntos/comissao-interministerial-de-contratacoes-publicas-para-o-desenvolvimento-sustentavel. Acesso em 04 jun 2025.

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